terça-feira, 13 de novembro de 2007

Na “Ilha das Flores”, o tomate não pode ser Furtado

A história didática e não-ficcional, retratada no curta “Ilha das Flores”, poderia ser engraçada, se não fossem as cenas finais que levam à reflexão do quanto somos mesquinhos ao deixarmos que seres humanos com telencéfalos altamente desenvolvidos e com polegares opositores comam a comida dispensada pelos porcos.
Espera aí! Contei o final do filme, que droga! Aí está um grande motivo para não assistí-lo, não é? Poiseu te respondo: não. Jorge Furtado, esqueci de dizer, é o diretor do curta-metragem e representa muito bem em pouco mais de 13 minutos o que muitos tentam a vida toda: como a sociedade pode ser realmente descompromissada com a causa social e como nossa mente está tão acostumada a assimilar o texto e a imagem como coisas diferentes, que, quando Furtado complementa um como o outro, requerem de nós um tremendo esforço para assimilar os fatos apresentados assistindo apenas uma vez.Mas o que tem de tão especial, fantástico, aterrador e reflexivo neste curta? Um tomate. Isto mesmo, um pequeno e indefeso tomate que tem sua vida privada violada por um depravado diretor com uma câmara na mão. A trajetória do tomate começa na plantação do senhor Suzuki, passando a ser adquirido pela vendedora de perfumes, dona Anete, que prepara um delicioso molho de tomates para acompanhar a carne de porco que sua família faminta devora em poucos takes. Os tomates podres são jogados no lixeiro pela dona Anete e vão parar na Ilha das Flores, um depósito de lixo no qual vivem famílias e criação de porcos. Os tomates não comidos pelos porcos são dados às famílias pobres que residem lá (ou deveria dizer, que sobrevivem lá), e o final eu já contei para vocês, caros amigos.Jorge Furtado é brilhante ao casar a imagem com o off, pois muitas vezes eles não são simplesmente uma complementação do outro, mas o inverso que provoca a reflexãosobre se realmente as coisas ditas pelo narrador – que tanto conhecemos do colégio ou mesmo da universidade – são realmente verdadeiros. Neste aspecto, o curta mostra uma série de acontecimentos que expressam contradição entre o ensino e a realidade.Quando o narrador fala dos tomates e dos porcos, cita que os judeus não comem carne de porco. Nesta hora, enquanto o narrador fala que eles também são seres humanos, vão passando imagens do holocausto nazista na Segunda Guerra para ilustrar que eles foram tratados com extrema crueldade e desumanidade, mesmo tendo telencéfalos altamente desenvolvidos e polegar opositor.Outro exemplo mostrado é a capacidade do homem de utilizar seu potencial mental (através do telencéfalo altamente desenvolvido) com a utilização física (polegar opositor) para... o narrador faz uma pausa e aparece o cogumelo de fumaça de uma dasduas bombas nucleares explodidas pelos Estados Unidos contra o Japão (o país de origem do senhor Suzuki, o plantador de tomates) ...plantar tomates. Neste caso a pausa e a explosão serviram para mostrar que o homem, que se julga o mais inteligente dos seres da criação, pode e continua a fazer cagadas antológicas, mesmo com um telencéfalo altamente desenvolvido. Apesar do nome, nem tudo neste filme são “flores”. O diretor utiliza um humor ácido e sarcástico para mostrar a dura realidade de milhares de famílias que vivem em condições piores que a dos porcos daquela ilha. Em meio à pilha de lixo que é depositada lá diariamente, encontraram uma prova de história de uma garotinha de classe média. Furtado insinua que alguns produtos orgânicos como tomates e provas de história são dados para os porcos comerem, fazendo alusão ao pedaço de papel encontrado no lixo. Talvez se os conhecimentos de história fossem guardados nos telencéfalos altamente desenvolvidos e não em pedaços de papel, não teríamos tantos problemas sociais como temos hoje.Mas, enquanto isso não acontece, provavelmente este pedaço de papel vai acabar embrulhando algum pedaço de comida podre em alguma Ilha das Flores qualquer.

Carlos Dori

7 comentários:

Anônimo disse...

São os 13 minutos mais sublimes que eu já vi em vídeo.

Anônimo disse...

tô aqui tentando usar toda a capacidade do meu telencéfalo altamente desenvolvido, meus polegares opositores e todos os outros dedos pra escrever um comentário decente, mas...
nem assim!

eeeeeeeeeeee
eu sou a mais chata que vai ler e comentar todos os textos!!!
bjo

Anônimo disse...

está no caminho Su!
hehehe

Anônimo disse...

no caminho de escrever um comentário decente ou de ser uma chata?
huahuahuahua

nem responda!

Andrei disse...

Gaita negra. Sublime! eu diria de uma sensibilidade extrema e de uma competência invejavel...

Andrei disse...

muito bom o texto carlos...

Escaleros 2011 disse...

mto PHODA o texto, sr. Cacá